Alexandre Correia, seleccionador nacionalQueremos ir à fase final do Europeu 2004

O apuramento para as meias-finais do Europeu da Selecção Sub18, em Abril passado, foi um feito que passou despercebido pela imprensa desportiva nacional, mas que recebe o devido valor nesta altura do lançamento do Portal do Basquetebol Português.

Seleções
18 DEZ 2003

A par dos doze bravos que elevaram o nome de Portugal, Alexandre Correia é o seleccionador que fica ligado a um resultado ímpar nas camadas de formação e que prepara agora a etapa final rumo ao Europeu de 2004, em Espanha.

Os jovens portugueses sub-18 lograram um apuramento impressionante face aos adversários com quem mediram forças. No grupo de apuramento que se disputou na Sérvia & Montenegro, Portugal superou selecções como a Ucrânia (79-58), a Roménia (80-32) e a Áustria (80-63), perdendo apenas com as fortíssimas Turquia (68-82) e Sérvia & Montenegro (68-94). Passada esta fase, Alexandre Correia e os seus pupilos vão disputar, entre 1 a 5 de Abril, na Grécia, as meias-finais do Europeu 2004 contra selecções de maior valor, como são os casos dos anfitriões, da Rússia, Bulgária, Israel e Estónia, mas o espírito colectivo que os levou até aqui, poderá ser decisivo para que Portugal consiga finalmente estar presente entre as doze melhores selecções juniores a nível europeu. As meias-finais de Qualificação estão espaçadas em três grupos de seis equipas, das quais apuram-se as primeiras três em cada grupo e ainda os dois melhores quartos classificados. A estas onze equipas, junta-se a Espanha que albergará a Fase Final do Europeu de 2004 em Julho próximo.Em entrevista ao Portugalbasket.pt, Alexandre Correia abordou os mais variados assuntos relacionados com a sua selecção; a participação dos sub-18 na Sérvia & Montenegro; as diferenças ainda por suprimir em relação a selecções tidas como mais fortes; o destino dos jogadores que lograram o apuramento; as vantagens e desvantagens do novo sistema competitivo dos europeus que vão passar a eventos anuais e não bi-anuais, já a partir de 2005; a omissão do apuramento na generalidade da imprensa desportiva lusa; entre outros assuntos ligados à formação. Para a história ficam aqui registados os nomes e a pontuação dos 12 jogadores que regressaram da Sérvia com um resultado extremamente positivo para o desporto português: João Santos (40), Stéphane Freitas (5), António Pires (56), Celso Figueiredo (2), José Almeida (86 e inclusão no Cinco Ideal), Hugo Mota (41), Fábio Fernandes (47), Diogo Teixeira (42), Miguel Graça (18), Pedro Marta (10), David Gomes (19) e Vítor Carvalho (9).Portugalbasket.pt (Pb) – Quais as expectativas da comitiva portuguesa antes da viajem para a Sérvia e Montenegro?Alexandre Correia (AC) – Fomos conscientes que iríamos defrontar selecções de bom nível, habituadas a estar nas fases finais como a Turquia e a Sérvia. À partida estas duas selecções são sempre enormes candidatas aos primeiros lugares. Nos restantes jogos, conseguimos vitórias claras sobre equipas que como nós lutavam pelo outro lugar de apuramento. Desses três adversários, aquele que à partida era considerado mais temível era a Ucrânia, mas conseguimos uma exibição muito boa e uma vitória clara por 21 pontos. Apresentámos uma estrutura de jogo mais organizada em termos atacantes, mas a chave da vitória foi a defesa que conseguimos explanar, nomeadamente na segunda parte, uma vez que chegámos ao intervalo a vencer por dois pontos. Conseguimos adaptar a nossa defesa às características da equipa ucraniana que era muito virada para a intervenção dos postes. Na segunda parte permitimos apenas 18 pontos e sete no último período.Pb – E o espírito da equipa após o dever cumprido?R – Foi curioso a forma como acabámos o Torneio. Na cerimónia de entrega de prémios quem mais festejou fomos nós. Sentimos que tínhamos sido aqueles que alcançaram o objectivo mais difícil. Saímos com as nossas convicções reforçadas. Na semana anterior, a Turquia e a Sérvia tinham participado na final do Europeu de Cadetes. A Turquia apresentou um grande número de jogadores dessa selecção de 1987.Pb – Que tipo de conclusões retirou da fase de apuramento? AC – Penso que a experiência na Sérvia fez-nos reflectir sobre quanto mais nós temos de trabalhar do que um país como a Sérvia para podermos alcançar um nível de jogo equilibrado. Existe uma enorme diferença relativa aos hábitos de actividade física por parte das crianças. Na cidade onde estivemos sediados víamos com imensa frequências as crianças a fazerem uma vida ao ar livre, a praticarem as mais diversas modalidades desportivas. As próprias características físicas da população local eram impressionantes. Há uma diferença muito grande de estatura média. Era frequente ver rapazes de 2 metros e raparigas de 1m80. Não há dúvida que nesses países há mais oportunidades em termos de encontrar jogadores com estatura elevada e por outro lado, nós carecemos de hábitos de actividade física entre as crianças. Penso que estamos em decréscimo neste particular. As nossas cidades não estão preparadas para fornecer os meios desportivos e essa lacuna foi visível ao passearmos pelas cidades sérvias.Pb – Qual a importância de uma competição internacional?AC – A experiência internacional é imprescindível para que possamos elevar o nível de competitividade das nossas selecções. As nossas dificuldades começam por ser geográficas. Estamos afastados do centro da Europa onde muitas selecções têm oportunidade de se defrontar dadas as curtas distâncias que têm de percorrer e a possibilidade que detêm de trocar conhecimentos e aprenderem mutuamente. Nós sofremos com a falta de contacto internacional que temos. É um factor que existe sempre que vamos para uma fase de qualificação, a dúvida inerente a situações novas. Pelo contrário, os jogadores retornam com uma experiência que lhes confere maior segurança e confiança no seu valor.Pb – Notou diferenças a nível técnico entre as selecções?AC – Penso que fizemos uma aproximação em termos técnicos. Não há diferenças substanciais relativamente às realidades das outras selecções, apenas talvez, alguma diferença em termos da particularidade do acto de lançamento. Penso que temos ainda alguma dificuldade no ensino do lançamento, do gesto em si, que se nota em diversos jogadores portugueses ao contrário de outras selecções. Tem a ver com a atenção que é dada a este gesto técnico no ensino dos grupos etários mais baixos. Se há determinadas incorrecções fixadas na aprendizagem de um jovem, é difícil corrigir esses automatismos mais tarde. Saindo da questão técnica, as maiores diferenças advêm das características físicas que os jogadores adquirem. O contacto físico é muito acentuado ao contrário daquilo que acontece em Portugal. Só passando por essas experiências é que estas aprendizagens se fazem. Não basta dizermos aos jogadores como é que acontece num jogo internacional, é preciso que eles sintam e façam as suas próprias adaptações. Claro que isto também passa pela experiência táctica. As selecções não jogam todas da mesma forma, é preciso passar por diversas formas de jogar para desenvolvermos respostas. Portanto, essas experiências internacionais são determinantes e é preciso que sejam mais acentuadas.Pb – Notou mais diferenças?AC – Os aspectos onde eu penso que as diferenças ainda nos são bastante desfavoráveis em relação às melhores selecções, prendem-se com a questão da estatura. Os indicadores estatísticos revelam isso mesmo. Durante a Fase de Apuramento, os aspectos em que estivemos pior foi nos ressaltos, nos desarmes de lançamento e nas percentagens de lançamentos de dois pontos, que são acções mais específicas dos jogadores grandes. Nesta selecção conseguimos uma média de estatura razoável, tínhamos sete jogadores, de doze, entre o 1m96 e o 1m99. A nível de bases e extremos estávamos em igualdade com as outras selecções, mas nas posições mais interiores, não tínhamos nenhum jogador acima dos 2m, portanto, temos de trabalhar colectivamente para conseguir situações de lançamento que evitem a intimidação dos postes adversários. Obriga-nos a um trabalho colectivo muito elaborado para suprirmos essa diferença.Pb – Teria sido possível melhor do que o terceiro lugar?AC – Ficarmos numa posição melhor do que aquela que conseguimos, a terceira, não faz diferença porque o objectivo era o apuramento e qualquer lugar entre as três primeiras conferia esse estatuto.Pb – Qual o significado actual do apuramento para as meias-finais?AC – O significado é muito grande, quer para treinadores e jogadores, quer para a própria Federação. É importante sentir que o modelo em que nós estamos a apostar, nomeadamente, com trabalho em Centros de Treino, pode promover a inversão dos resultados das nossas selecções. É claro que acontecer uma vez não significa que o mesmo vai suceder sistematicamente, mas não deixa de ser um excelente exemplo porque foi alcançado numa série muito difícil. Terá ainda um significado maior se realmente conseguirmos o apuramento para o Campeonato Europeu. Além de que, para os jogadores, é um privilégio estar nesta fase da competição. É uma forma de compensação pelo trabalho que fazem nos Centros de Treino, porque não é uma vida fácil para o jovem, ou pelo menos não é a habitual, portanto serve quase como um alento para o futuro.Pb – Que possibilidades tem Portugal de qualificação para a Fase Final do Europeu face ao valor dos adversários?AC – Seria fácil assumir uma posição defensiva, ou seja, dizer que vamos para ganhar experiência internacional e reduzir distâncias a nível competitivo. Mas não vamos fazer isso. Face ao comportamento que esta selecção tem tido vamos com um objectivo definido que é alcançar a passagem para a Final. É claro que esse objectivo é extremamente difícil de alcançar porque nesta fase já não há selecções consideradas acessíveis e historicamente, Portugal nunca obteve, em qualquer escalão, masculino ou feminino, um apuramento para a fase das doze melhores selecções europeias. Vamos tentar ser os primeiros a alcançar esse feito.Pb – Qual o plano de trabalho até às meias-finais?AC – Fizemos um pequeno estágio em Dezembro e vamos culminar este primeiro período de trabalho com uma ida a Espanha para fazer dois jogos com a selecção espanhola. Depois, vamos ter um Torneio Internacional organizado em Portugal que tem previsto a participação das selecções da Polónia, Turquia e Israel e que decorrerá no período do Carnaval (27-29 Fevereiro). A preparação final acontecerá na semana imediatamente antes do início das meias-finais na Grécia. Vamos ter também curtos estágios entre o Torneio Quadrangular em Portugal e a última semana de preparação. É difícil fazermos mais do que isto porque os clubes estão em actividade e temos de conjugar as nossas acções com os calendários das competições internas.Pb – O que espera das selecções adversárias nas meias-finais?AC – São selecções muito fortes fisicamente com uma cultura de jogo superior. A Grécia é fortíssima e é uma eterna candidata, além de jogar em casa, portanto será muito difícil para nós. A Rússia e Israel também são habituais finalistas, enquanto que a Estónia e a Bulgária não são tão regulares. A Rússia, Bulgária e Israel vieram da mesma Fase de Apuramento. A Grécia ganhou largamente na sua série e apresentou resultados muito desnivelados. Vamos tentar competir e ser melhores.Pb – Qual o destino dos jogadores que lograram o apuramento?AC – No ano passado tínhamos nove jogadores da Selecção que faziam parte do Centro Nacional de Treino do Jamor e mais um jogador que treinava connosco regularmente. Este ano, desses jogadores, apenas três permanecem no Centro de Alto Rendimento. Houve jogadores que estiveram quatro anos nos Centros de Alto Rendimento e naturalmente seguiram a sua evolução. Essa evolução passa pela integração em equipas seniores aproximando-se dos níveis mais elevados do basquetebol em Portugal. Posso realçar que três desses jogadores que mais tempo passaram nos Centros de Alto Rendimento saíram directamente para equipas da Liga Profissional. Outros jogadores com menos anos nos Centros de Treino, acompanharam essa solução e estão agora bem enquadrados em clubes que conseguem dar continuidade à sua evolução. É um passo natural porque alguns jogadores alcançam um nível competitivo que os Centros de Treino já não possuem, portanto é adequado a sua saída e integração em clubes da Proliga e Liga. Penso que se encontraram boas soluções para os jogadores prosseguirem o seu desenvolvimento. Em contrapartida, a preparação para as meias-finais causa menos segurança em termos de jogo colectivo porque os jogadores estão afastados, não trabalham rotinas diariamente como antes faziam juntos, mas são aspectos que vamos tentar eliminar nos próximos estágios.Pb – O que acha do novo sistema de disputa dos campeonatos da Europa?AC – Há vantagens e desvantagens. Os jogadores que nasciam em anos pares jogavam como mais velhos nos campeonatos juniores e Sub-20, enquanto que jogadores nascidos em anos ímpares nunca poderiam jogar nos seus anos fortes. Isto causava alguma diferença de oportunidades para os próprios jogadores. Este novo sistema é mais igualitário nesse aspecto. Há também outras características que mudam. Muda necessariamente o período de trabalho de cada selecção. Terá de haver em simultâneo, uma maior número de selecções a trabalhar o que levanta mais encargos financeiros para as federações dos países. Penso também que em termos organizativos será um desafio complicado para anualmente haver a capacidade de organizar tantos campeonatos da Europa com um número elevado de participantes, porque agora as fases finais passam a ter dezasseis equipas. Será uma dificuldade logística.Pb – Consegue explicar o pouco impacto criado por este apuramento histórico?AC – O que sinto em Portugal é que a atenção dada pela imprensa desportiva às modalidades que não futebol é muito reduzida. É quase uma afronta, porque não estimula a prática desportiva, faz girar tudo à volta do Futebol e isso é limitativo para as opções dos potenciais praticantes. É uma informação reduzida e ingrata para as muitas pessoas ligadas à formação nas modalidades. Relativamente ao que aconteceu com o nosso feito, nós temos de fazer mais coisas que sejam importantes e para que não possam voltar a ser ignoradas.

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