«É necessário dar passo em frente»
Depois de a Seleção não ter conseguido o apuramento para o Campeonato da Europa, Mário Palma poderia ter aceite um qualquer convite milionário de outra federação, mas preferiu ficar e ajudar a “enfrentar este quadro negro em que se encontra o basquetebol nacional”.

Seleções | Treinadores
9 NOV 2012
Conheça nesta entrevista os projetos e as metas que o selecionador nacional se propõe atingir, bem como o diagnóstico que faz da modalidade no nosso país.
O que o levou a aceitar renovar o vínculo com a FPB no cargo de Selecionador Nacional?Tenho consciência que esta é uma fase extremamente difícil para a Seleção, mas tendo em conta o respeito com que sempre fui tratado, as condições de trabalho que me foram proporcionadas, não podia recusar assumir este período de transição tão complicado. Mais fácil teria sido retirar-me. Mas é necessário que pessoas dêem o passo em frente e assumam as responsabilidades de enfrentar este quadro negro em que se encontra o basquetebol nacional.Que prioridades definiu para este novo ciclo de trabalho?Implementar um modelo de jogo que ligue todas as Seleções jovens, bem como estreitar uma permanente ligação entre todos os treinadores que trabalham com Seleções. É necessário que exista uma colaboração eficaz entre todo o quadro técnico da Federação de modo a que se trace um objetivo claro para o futuro. Todas as pessoas envolvidas no processo devem sentir-se confortáveis com o que irão fazer, para que toda a área da formação se torne mais forte e coesa, e se possam formar mais jogadores para o futuro. Falando agora mais concretamente da Seleção sénior, e depois do balanço que certamente fez da última fase de qualificação, quais os aspetos em que a Seleção tem necessariamente melhorar para futuro?Em várias áreas. A equipa tem de saber jogar em campo aberto. Está obrigada a melhorar muito a eficiência do lançamento de modo a poder valorizar em cestos de campo as muitas ações que cria em termos ofensivos. Evoluir ainda mais na defesa do 1X1, bem como nos bloqueios na bola, especialmente na zona central do campo. Embora o aspeto mais importante seja provavelmente conseguir jogar concentrada durante 40 minutos. Mas para que isso seja possível obriga a hábitos de treino e de jogo que têm de ser completamente alterados, e daí a importância do trabalho que se realiza nos clubes.Por diversas vezes fez referência à falta de minutos de jogo de alguns jogadores da Seleção, assim como a pouca experiência internacional da grande maioria deles. Reafirma que são essas as principais causas para estarmos num nível um pouco abaixo em relação às melhores seleções europeias?Um fator incontornável é que somos mais baixos que as outras equipas europeias. Não temos uma rotatividade muito grande, uma vez que existe uma decalage entre os jogadores que compõem a Seleção, razão pela qual não podemos ir para pressões todo campo exatamente pela qualidade dos suplentes. A falta de experiência internacional agravou ainda mais este cenário, ao fazer com que as equipas apenas façam um jogo por semana, uma situação que só piora as coisas. Se juntarmos a tudo isto a crise económica que afeta os clubes todos, que faz com que muitas vezes jogadores importantes não treinem o volume e a intensidade suficiente que são exigidas para a alta competição a que se joga na Europa, temos criada a tempestade perfeita!Depreendo então, por todo o seu discurso, que reconhece qualidade e potencial aos jogadores portugueses?Os jogadores são vítimas neste processo todo, uma vez que não terem tido a possibilidade de participar na competição internacional, e isso reflete-se naturalmente no contato internacional que lhes é proporcionado. Só a jogar com equipas e jogadores mais fortes é que podemos evoluir. A partir do momento em que isso deixou de ser possível, os atletas nacionais ficaram muito condicionados na sua evolução Durante esta fase de apuramento, o respeito e a atitude que mostraram pelo jogo foi das coisas que mais me marcou. E não fossem os problemas financeiros que envolvem o basquetebol português e teríamos sido muito mais fortes. Houve uma geração que ainda beneficiou disso, mas cada vez mais vamos perder o comboio da Europa, isto porque deixamos de competir nas provas europeias, o que faz com que os nossos jogadores não tenham condições de trabalho iguais. Apesar de tudo isto, sinto-me orgulhoso do trabalho, da atitude profissional, do desejo de evoluir demonstrado pelos jogadores, e garanto que não são eles o problema o basquetebol português. Posso garantir que trabalham bem e foram excecionais na forma como se entregaram, algo que também começa a ser verdadeiro para os jogadores mais jovens, uma vez que vão pelo mesmo caminho. Só assim conseguimos o que fizemos, isto sem esquecer o apoio incondicional que a Federação nos deu ao longo de todo este período.Tem alguma proposta ou ideia para contornar o problema da falta de contacto internacional?Nos últimos anos utilizaram-se muitos jogadores estrangeiros na competição nacional, e isso teve consequências muito graves na afirmação dos jogadores jovens portugueses, uma vez que deixaram de ter hipóteses e espaço nos seus clubes. Se a isto juntarmos o facto de os clubes não participarem na competição internacional, encontramos a explicação para o estado atual do basquetebol português. Enquanto os clubes não garantirem que o seu quadro de jogadores esteja renovado e com a consistência exigida, deve-se manter a regra de dois estrangeiros. Se optar-se pelos comunitários então não se permite a entrada de jogadores americanos. Exceto o caso de haver clubes que queiram participar nas prova europeias. Mas se isto acontecer penalize-se então, como acontece já em outras Federações, os clubes que se recusem a participar nas competições europeias.No futuro próximo, qual será a equipa a iniciar os próximos trabalhos da Seleção Nacional?A Seleção de Esperanças continuará a trabalhar, e eu vou dedicar especial atenção a essa equipa. Em virtude que ainda falta apurar uma equipa para o próximo Campeonato da Europa, temos de aguardar pela definição da competição que vai dar acesso a esse lugar. Se sentir que não existem fortes possibilidades de apuramento, poderá dar-se o início da renovação anunciada da Seleção. Mas isso será sempre uma decisão política e que só poderá ser tomada pela Direção da Federação, sendo que depois seguirei esse caminho. Assumindo eu essa responsabilidade, porque não vai ser nada fácil, desde que em consonância com a própria Direção.Definiu algum objetivo a curto/médio prazo para a Seleção Nacional?Criar as condições para que seja rápida a transição de uma geração para a outra. Implementar um modelo de jogo para todas as seleções nacionais, para que no futuro os jogadores se integrem e saibam perfeitamente o que esperar nas outras seleções.Um desejo que gostaria de ver realizado para bem do basquetebol nacional?Voltar a ver uma Seleção Nacional numa fase final de um Campeonato da Europa, e que hajam equipas portuguesas a participar regularmente na Euroliga. Que o basquetebol se tornasse na 2ª modalidade do país, e recebesse os mesmos apoios que as equipas em Espanha. Mas para que isto acontecesse era necessário que os dirigentes e as pessoas ligadas aos clubes se decidissem por apostar ainda mais para competir a nível internacional.