Sérgio Ramos: «Faltou presença na Euroliga»

Um dos mais brilhantes jogadores portugueses de sempre resolveu colocar um ponto final num percurso de duas décadas, em que jogou ao mais alto nível, representando clubes em alguns dos melhores campeonatos europeus.

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17 OUT 2012

Agora, aos 37 anos, prepara-se para abraçar a carreira de treinador nos escalões de formação do Benfica, uma nova etapa, um desafio aliciante, onde certamente continuará a ser bem sucedido. Leia a entrevista nos detalhes desta notícia.

Houve alguma hesitação quanto ao colocar um ponto final na sua carreira de jogador? Terminar uma carreira desportiva nunca é um momento fácil especialmente, quando ainda te sentes com disponibilidade mental para treinar e tentar ser melhor cada dia. Tive uma longa carreira desportiva, cerca de 20 anos como sénior, e não queria terminar estando lesionado. No entanto, existiram vários factores que me levaram a tomar esta decisão.Olhando para trás, quais os momentos mais marcantes da sua carreira? É difícil eleger porque foram muitos os momentos marcantes: a subida aos seniores com 16 anos, a ida para o Benfica com 19 anos, o meu primeiro ano no estrangeiro em Itália, a aventura em Espanha de competir na melhor Liga da Europa e jogar contra os melhores jogadores do continente, o regresso para o Benfica e contribuir para ganhar, 14 anos depois, o campeonato nacional.Os momentos onde me senti mais realizado a nível profissional foram os anos onde competi na Liga ACB, onde a minha capacidade competitiva atingiu níveis mais elevados e senti que podia competir contra qualquer adversário.Ficou por alcançar algum objetivo que tinha em mente? Ficou a mágoa de não saber onde podia ter chegado se não tivesse ficado 2 anos sem competir por causa das 2 operações que realizei ao joelho direito. Quando poderia ter dado o salto competitivo para uma equipa de topo em Espanha aconteceu a lesão no joelho que interrompeu a progressão desportiva e a evolução que estava a ter como jogador. O objetivo de fazer parte de uma equipa de topo na ACB, que participasse na máxima competição Europeia (Euroliga), foi um dos objetivos que ficou por realizar.Sempre se imaginou no papel de treinador? Isso ajudou-o a tomar a decisão de deixar de jogar? Já tinha tido uma experiência com treinador-adjunto em 2005, quando trabalhei com o professor José Tavares nos cadetes A do Benfica. Foi uma experiência gratificante e que me fez ganhar o gosto pelo treino e por ensinar o jogo. Por esse motivo ingressei novamente na Universidade e tenho frequentado cursos de formação com o objetivo de me preparar o melhor possível para assumir funções de treinador. No entanto o facto de ter deixado de jogar não foi motivado pelo meu desejo de treinar, apesar de nos últimos anos, enquanto jogador, ter vindo a assumir um pensamento mais crítico e reflexivo sobre o papel e as funções do treinador.Foi por opção sua que começou a treinar uma equipa de formação? Não foi opção treinar uma equipa de formação, no entanto considero que um treinador deve passar por um processo normal de aprendizagem, que deve incluir etapas em equipas de formação. Ser jogador não é o mesmo que ser treinador, são necessários outros conhecimentos, outras capacidades, outra postura e comportamentos, que são adquiridos com a formação teórica e, principalmente, com a prática diária do treino. Não nos tornamos treinadores de um dia para o outro, é necessário estudar, aprofundar conhecimentos, trocar ideias e opiniões e depois treinar, treinar muito, pois só com a prática podemos evoluir enquanto treinadores. Treinar seniores e equipas de formação são duas coisas distintas, apesar de terem algumas similitudes, como a exigência, a disciplina, o rigor, a entrega e dedicação às tarefas diárias. Os objetivos individuais e coletivos, as necessidades e as expetativas dos atletas relativas à prática desportiva não são os mesmos e por esse motivo os conteúdos do treino têm que ser diferentes. Joguei 20 anos como sénior e, possivelmente estaria habituado e até mesmo preparado para treinar uma equipa sénior, no entanto esta etapa é importante na minha aprendizagem e formação como treinador. Considera um bom sinal o facto de vários ex-jogadores estarem a assumir a responsabilidade de treinar em Portugal? Acho positivo que assim o façam, desde que se formem e ganhem capacidades e competências para desempenhar bem o papel de treinadores. As vivências de jogador são importantes e dão-te um feeling especial sobre aquilo que acontece no seio de uma equipa, mas não são condição suficiente para se ser um bom treinador. A formação teórica, a troca de experiências com outros treinadores e, sobretudo a prática do dia-a-dia, são os factores essenciais no crescimento de um treinador. A minha primeira experiência como treinador em 2005 elucidou-me para a necessidade de melhorar a minha formação e desenvolver competências que nada têm a ver com as competências de jogador. Aconselho a todos os ex-jogadores que gostem de treinar a não descurar essa formação e a deixarem-se guiar por técnicos mais experientes, que os possam ajudar nas primeiras etapas de treinador. Será que existem em Portugal esses treinadores experientes e com disponibilidade e capacidade para ensinar jovens treinadores a treinar? É uma questão que não me compete a mim responder, mas deixo a reflexão no ar.Houve algum treinador que o tenha marcado, ao ponto de ser a sua referência no ensino do basquetebol? Tive dois excelentes treinadores na minha formação como jogador, o Jorge Faustino e o Luís Guedes. Ensinaram-me as técnicas e táticas do jogo, mas sobretudo ensinaram-me a ter paixão pelo jogo, a ser perseverante na busca dos meus objetivos, a ter confiança em mim mesmo, a respeitar os outros, a divertir-me e fazer amigos no basquetebol.No alto rendimento tive muitos treinadores, todos eles importantes, mas destacaria dois: o Jorge Coelho, pela oportunidade que me deu de crescer jogando e cometendo erros na equipa sénior do Estrelas da Avenida quando tinha apenas 17 anos; e o Edu Torres, que foi o treinador que melhor soube potenciar as minhas qualidades e mais contribui para o enorme salto qualitativo que dei como jogador de basquetebol – a sua forma de comunicar, de motivar e de ensinar foram decisivas na minha evolução.O que considera ser fundamental transmitir aos miúdos neste seu novo papel? Acho importante transmitir-lhes a mentalidade, ou se quisermos o hábito comportamental, de tentarem ser melhores cada dia em todos os aspetos da sua vida, quer seja no basquetebol ou na escola. É importante que cada um deles estabeleça objetivos pessoais e que, com dedicação, espírito de sacrifício, trabalho, perseverança possam lutar por ter melhores resultados, seja a nível desportivo ou escolar. Sem estes fatores não podem tornar-se bons jogadores nem em profissionais competentes em qualquer área que escolham no futuro. O talento não chega, é necessário algo mais, tentar superar-se cada dia que agarram numa bola ou num livro escolar. Por esse motivo, os treinadores devem ser responsáveis, não só por ensinar as técnicas e táticas do jogo, mas também por ensinar os comportamentos e hábitos que deve ter um jogador de elite. Acredito profundamente no potencial formador e educador que o desporto possui e, por esse motivo, é fundamental educar os nossos jovens os comportamentos e as atitudes adequadas a ter em contexto desportivo e na vida em sociedade. O desporto oferece oportunidades únicas de convívio, de cooperação, de trabalho em equipa, de aprender a respeitar os outros, de lidar com a frustração da derrota e com a alegria da vitória, de perseverança e superação. É neste contexto que os treinadores têm a responsabilidade de intervir: nem todos serão jogadores profissionais de basquetebol mas todos eles se podem tornar em cidadãos e profissionais responsáveis e competentes.Alguma mensagem que queira deixar? Aqueles que gostem de basquetebol e que tenham a ambição de ser melhores cada dia, não deixem de trabalhar com dedicação e perseverança para alcançar os seus sonhos ou objetivos, sejam eles chegar à Liga Portuguesa, à Liga ACB ou à NBA. Não tenham medo de sonhar alto e ambicionar algo que nunca foi alcançado anteriormente. Para treinar basquetebol apenas necessitamos uma bola e um cesto. Não necessitamos treinadores (às vezes atrapalham mais do que ajudam!) nem de ninguém que nos diga o que fazer. Treinem, treinem sozinhos e treinem muito e não deixem de sonhar. Um repto: nenhum jogador português chegou à NBA. Quem será o primeiro?

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17 OUT 2012

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