Um dos melhores treinadores do mundo
Aíto Garcia Reneses é um dos melhores Treinadores do Mundo. No seu currículo constam nove títulos nacionais de Espanha e uma medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Pequim.
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3 NOV 2011
No entanto, a sua capacidade de lançar jovens ao mais alto nível é o que o distingue de outros Treinadores de topo. Juan Carlos Navarro, Pau Gasol, Rudy Fernandez e Ricky Rubio são os nomes mais sonantes de uma vasta lista de jogadores que chegaram à Liga ACB pela sua mão. A ANTB tem o prazer de lançar o seu site com uma entrevista a este senhor do Basquetebol.
ANTB.pt – Neste momento não se encontra a trabalhar em nenhum clube. É uma opção ou são contingências da vida de Treinador?Aíto Garcia Reneses (AGR) – Nos últimos 40 anos estive sempre a treinar alguma equipa. Por duas vezes, estive um ano sem treinar e esta é a terceira vez. Não sei o que vai acontecer no futuro. Pode ser que não volte a treinar ou poderei voltar, mas é algo que não depende só de mim. Depende de haver clubes interessados e de que eu considere que é um projecto interessante.ANTB – Nunca treinou fora de Espanha. Seria interessante viver uma experiência no estrangeiro?AGR – Ao longo dos anos tive várias propostas do estrangeiro. No entanto, como o basquetebol em Espanha estava a crescer e eu estava a desfrutar, sempre recusei as abordagens. Houve convites, mas nunca houve conversações sérias. Agora, se houver possibilidades, estou aberto a estudá-las.O Europeu da PolóniaANTB.pt – Em relação ao último Europeu da Polónia, o que achou do nível do jogo e da competição em geral?AGR – Parece-me que as equipas tentaram fazer coisas muto parecidas umas com as outras. Creio que o mais importante que se pode retirar da competição é que as coisas que as equipas fazem, podem fazer-se bem, de forma regular ou muito bem. E o que diferencia o nível a que as equipas fazem as coisas é a técnica individual dos jogadores.E em Espanha, há muitos jogadores que têm muito boa técnica individual. Exemplificando – não é a mesma coisa ser eu a jogar um bloqueio directo ou ser o Juan Carlos Navarro. Ter jogadores da capacidade de um Navarro, de Pau e Marc Gasol ou de Rudy Fernandez dá à tua equipa um nível de jogo superior. Mesmo que na teoria estejas a realizar as mesmas coisas que outras equipas.ANTB.pt – Considera então que a grande diferença esteve na qualidade dos jogadores espanhóis?AGR – Sim, sem dúvida. Embora o nível do Europeu tenha sido muito elevado. Como tive a oportunidade de afirmar durante o Clinic, o basquetebol dos Estados Unidos estava, há 20 anos, 20 passos à frente do Europeu. Agora só está um passo à frente.ANTB.pt – Porquê que isso aconteceu? E acha que o basquetebol europeu pode ultrapassar o americano?AGR – Porque no resto do mundo se melhorou imenso. E se estiverem em “louckout” na NBA durante 5 anos, seguramente que vão ficar para trás.Lançando talentosANTB.pt – Durante a sua carreira, lançou vários jovens em equipas profissionais tais como Pau Gasol, Juan Carlos Navarro, Rudy Fernandez e Ricky Rubio. Foi uma casualidade ou entende que é sua responsabilidade como Treinador colocar jovens a jogar em equipas de elite?AGR – Creio que é minha obrigação colocar jovens a jogar se estes tiverem o nível suficiente. Tive a sorte de lançar Andrés Jimenez, depois Montero, Villacampa e os irmãos Jofresa. Mais tarde Navarro e Pau Gasol e no Joventut Badalona o Rudy Fernandez e o Ricky Rubio. A verdade é que eles tinham capacidade para jogar a alto nível e era minha obrigação confiar neles.ANTB.pt – Mas há que ter coragem porque quando optamos por um jogador jovem, há um jogador de 28, 30 ou 32 anos que passa a jogar menos minutos…AGR – Esta é uma questão que me colocam muitas vezes porque há algumas diferenças na minha carreira para a de outros Treinadores. Alguns lançam um jovem a cada dez anos enquanto eu lanço um a cada dois ou três anos. A questão não está tanto no facto de eu acreditar neles, mas que eles me demonstrem no treino que têm capacidade. Se isso acontece, é-me igual que tenham 18 ou 24 anos. Ou que tenham já um nome formado ou sejam completamente desconhecidos. Se demonstram no treino que têm capacidade, jogam. Depois se isso é aceite pela equipa, passam a considerá-lo normal. Dou o exemplo mais recente do Rubio que começou a jogar na Liga ACB com 14 anos, que é algo quase impossível. O jogador que concorreu com ele na mesma posição umas épocas mais tarde era o Elmer Bennet que já tinha 34, o dobro da idade do Rubio na altura. A sua relação era normal porque tanto o Bennet como os restantes companheiros reconheciam qualidade ao Rubio e todos colaboravam.ANTB.pt – Quando lançamos estes jovens, é normal que eles cometam alguns erros mais que o tal veterano de 28 anos. Mas são erros quase inevitáveis se queremos que ele progrida. Como gerir essas situações?AGR – Posso responder com o exemplo do Marcelinho Huertas que trouxe para o Joventut de Badalona há algumas épocas. Hoje em dia está no Barcelona e é um dos melhores bases da Liga ACB. Quando começou a jogar comigo fazia muitos “turnovers”, cerca de 3 por jogo. Hoje em dia faz um por jogo e várias assistências, fazendo mais minutos. Isto para dizer que é necessário algum tempo para os jogadores melhorarem. Se faz os tais 3 “turnovers” joga apenas 15 minutos por jogo. Quando melhorar passa a jogar 17 e depois 20, etc. Até porque fazia várias coisas bem como dirigir o contra-ataque e defender. Há que valorar tanto os erros como os pontos fortes. E depois há aqueles jogadores que são tão inteligentes que ajustam o seu jogo de forma a não cometer tantos erros e fazer apenas aquilo que interessa à equipa. O Ricky Rubio jogou uma final do Europeu de Sub-16 e marcou mais de 50 pontos. Nessa mesma época, a média de pontos dele no Joventut foi de cerca de 7 por jogo. Não fazia as mesmas coisas, revelando a sua inteligência ao adaptar-se ao que tinha capacidade para fazer em cada situação. A maior parte não tem esta capacidade e precisam de mais tempo, mas se trabalham bem temos que confiar neles.ANTB.pt – Falando em particular do Ricky Rubio. O que acha que se passou com ele no último ano. Parece que estancou um pouco a sua evolução?AGR – É difícil analisar porque não trabalhei com ele. Mas a verdade é que no Mundial da Turquia, nesta última época no Barcelona e no Europeu da Polónia esteve pior que em ocasiões anteriores. Confio que vá recuperar novamente a sua linha ascendente.ANTB.pt – Acha que os problemas ao nível do lançamento foram determinantes neste abaixamento de nível?AGR – Não. Lembro-me que no Europeu de Juniores lançava mais de 3 triplos por jogo com percentagens superiores a 50%. No último ano no Joventut e no primeiro no Barcelona teve boas percentagens de lançamento. Só nesta última época é que esteve mal tanto no lançamento exterior como até em zonas mais próximas do cesto. Creio que terá sido um problema circunstancial porque a sua mecânica de lançamento, não sendo perfeita, é bastante aceitável.O Basquetebol portuguêsANTB.pt – O basquetebol português tem vindo a perder qualidade e expressão nos últimos anos. Em que é que nos deveríamos basear para criar uma estratégia de desenvolvimento do nosso basquetebol?AGR – Creio que deveriam promover mais contactos internacionais, sobretudo com o basquetebol espanhol porque está muito próximo. Fazer o máximo de jogos possíveis tanto a nível de clubes, como de selecções. É provável que percam bastantes jogos, mas competem a um nível mais elevado o que leva à melhoria. Sobretudo, não devem ficar fechados no vosso país.ANTB.pt – Na principal liga portuguesa masculina, em que nenhuma equipa joga nas competições europeias, podem jogar 4 estrangeiros. No actual estado de desenvolvimento do nosso basquetebol, considera que é uma medida correcta?AGR – É difícil emitir uma opinião. No entanto, creio que todo o tipo de normas administrativas que condicionem a nacionalidade dos jogadores tendem a desaparecer. Em Espanha também há algumas normas que obrigam à presença de certo número de jogadores espanhóis ou que tenham sido formados na “cantera” do clube. São todas limitações transitórias porque a longo prazo, será a qualidade dos jogadores que vai definir quem joga e quem não joga.Até porque depois se inventam todo o tipo de situações para “dar a volta” aos regulamentos. Já viram a quantidade de americanos com passaportes da Geórgia, Macedónia, Congo e outros países?No entanto, pôr em prática algumas normas num determinado momento, para que o basquetebol se desenvolva pode ser que seja benéfico. Mas não conheço suficientemente a realidade portuguesa para dar uma resposta definitiva.ANTB.pt – Na Rússia, por exemplo, existem normas que obrigam a que esteja determinado número de jogadores russos entre os cinco que estão em campo. Como vê este tipo de medidas na perspectiva do Treinador?AGR – Parece-me estranho que as mesmas equipas joguem com umas normas na competição interna e outras na competição europeia. Isso é um problema grande para uma equipa.Podem criar as normas proteccionistas que quiserem, mas acredito muito mais no trabalho ao nível da formação. Posso ser um clube rico e ter dinheiro para contratar os melhores jogadores, mas, ao mesmo tempo, trabalhar bem na formação para que os jogadores consigam chegar à equipa profissional. Há que trabalhar com qualidade e ilusão na formação para que os jovens tenham capacidade para jogar na equipa principal.As normas administrativas não são o mais importante. Jogadores como Navarro e Gasol chegaram à primeira equipa do Barcelona quando esta tinha muitos estrangeiros e de qualidade. Depois esses estrangeiros foram para o banco e eram eles que jogavam. Isto porque trabalharam muito e bem e foram ajudados pelos Treinadores que trabalharam com eles.Um clube ou um Estado devem ter a aspiração de ter jogadores locais de grande nível e trabalhar para isso.ANTB.pt – Em Portugal há um problema ao nível dos desportistas jovens entre os 18 e os 20 anos. Quando entram na Universidade ou na vida profissional, é muito difícil conjugar isso com as horas que são necessárias para se treinar a alto nível. O que é que se deve fazer para conseguir um melhor equilíbrio entre as duas facetas?AGR – Cada caso pode exigir um planeamento diferente. Mas dando como exemplo o caso de um jogador de 18 anos que entra numa equipa profissional, creio que não se pode dedicar exclusivamente ao basquetebol. Tem que estudar e formar-se como pessoa. Não só como jogador profissional. A formação como jogador é tão importante como a sua formação social, cultural, etc.Deve fazer-se um esforço para compaginar as duas vertentes da sua vida. É importante que uma escola ou universidade facilitem ao jogador a possibilidade de alterar a data da realização de um exame porque coincidiria com a data de um jogo. Mas o clube também tem que fazer algumas concessões. O Rubio, por exemplo, não ia a todos os treinos porque coincidiam com a hora das aulas. Tem que se ir integrando os jogadores paulatinamente, sem descurar nenhuma das vertentes da sua vida.Isto porque um jogador com boa formação pessoal se torna um melhor jogador e também porque não temos a certeza que esse jogador vai ser, de facto, profissional de basquetebol. Se não o conseguir, tem de ter outras opções intactas. Não podemos permitir que os atletas percam os anos entre os 17 e os 21 para se formarem como pessoas. Ainda têm toda a sua vida pela frente.É difícil coordenar as duas vertentes, mas é essencial consegui-lo. Com cedências de parte a parte.ANTB.pt – O basquetebol espanhol deu um grande salto de qualidade em meados dos anos 80 com a criação da Liga ACB que levou a um desenvolvimento muito grande. Quais foram as principais condições que se verificaram para que esse salto qualitativo tenha sido possível?AGR – A iniciativa privada é essencial. Se estamos à espera que os organismos públicos tomem iniciativas, que a federação organize, é possível que isso aconteça. Mas não podemos estar de braços cruzados à espera que isso aconteça. Temos que ser nós a tomar a iniciativa.Quando diversos clubes e cidades se juntam e tentam criar uma organização, esta pode ter resultados positivos. Foi o que aconteceu com a Liga ACB. Queriam trabalhar numa estrutura melhor e ter mais condições de desenvolvimento. Um ou dois sozinhos não conseguiriam, mas juntou-se um grupo alargado e cada um deu os seus contributos.Levou a melhorias a todos os níveis desde qualidade dos pavilhões, bolas e cestos iguais para todos, mais promoção nos media e melhores condições para o público. Tudo isto elevou a qualidade do jogo.A Euroliga ANTB.pt – Em relação à Euroliga deste ano, que equipa ou equipas considera favoritas?AGR – Na época passada, as equipas gregas tinham um enorme potencial. Com os problemas económicos sentiram alguns problemas, sobretudo o Olimpiakos. O Panathinaikos defendeu-se melhor.O CSKA Moscovo reaparece com uma equipa de grande nível, depois as equipas espanholas com o Barcelona e o Real Madrid. O Armani Jeans Milano parece que não sente os problemas económicos e fez um grande investimento. E o Maccabi Telavive é sempre candidato.O vencedor sairá deste grupo de equipas. Não me parece plausível que apareça alguma equipa fora destas que referi (Panathinaikos, CSKA Moscovo, Barcelona, Real Madrid, Milano e Maccabi) que possa ter capacidade para lutar pelo título…..