Eugénio Rodrigues: «Vou ficar na Dinamarca»
O treinador pegou no Vaerlose BBK com o objetivo de manter a equipa na principal Liga Feminina do país, não só conseguiu como ainda a levou ao playoff.

Competições | Treinadores
26 MAI 2014
Mas o clube decidiu não continuar com a equipa sénior e propôs-lhe outro projeto, que declinou, por pretender continuar a trabalhar no setor feminino. Por isso aceitou o convite do BMS – Falcon, onde vai trabalhar na próxima época. Não perca a entrevista, nos detalhes desta notícia.
Balanço positivo desta sua primeira época na Dinamarca?Estou bastante satisfeito com esta primeira época fora de portas. Como devem calcular, eram mais as dúvidas do que as certezas e basicamente não tinha um único ponto de referência ou comparação que não fossem as minhas convicções ou ideias sobre o basquetebol. Pessoalmente, creio que foi bastante construtivo a todos os níveis e os feedbacks que obtive de terceiros foram igualmente nesse sentido.Os resultados desportivos ficaram aquém das suas expectativas ou do clube?Não, muito pelo contrário. Ficamos em 6.º lugar, tendo atingido os quartos de final da competição. O Vaerlose BBK tinha como objetivos exclusivos a manutenção, sendo que atingir o playoff era uma miragem, quase uma utopia, mais até como fator de motivação para o grupo de trabalho, do que para a própria Direção. Inicialmente conseguimos fugir aos lugares de despromoção para depois ultrapassar outros adversários de modo a atingir o playoff. Já no playoff, lográmos vencer mais dois adversários, teoricamente mais fortes e competitivos do que nós e assim atingir os já referidos quartos de final. O resultado foi de tal forma surpreendente que “obrigámos” o Clube a alterar jogos marcados para o pavilhão para realizarmos a última fase da competição…Na sua opinião, o que faltou para que a equipa conseguisse ser ainda mais competitiva?Faltou sobretudo atletas. O clube iniciou o projeto baseado em fatores que não existiam ainda que estivessem convictos de que fosse possível entre Julho e Setembro de 2013, dar a volta à situação. Porém, isso não aconteceu e vivemos “dias difíceis”. Como devem imaginar, o trabalho diário foi permanentemente influenciado por essa situação, e não tanto em função do que seria o ideal. Condicionou filosofias, sistemas, convicções e estratégias para “o jogo” o que, mais tarde ou mais cedo, traz uma fatura a pagar. Acredito que podíamos ter ido mais longe se as condições fossem outras. Quanto ao mais, nada me faltou e o Vaerlose BBK foi, e é, um clube que honrou todos os compromissos. Dirigentes, pais e atletas foram inexcedíveis para comigo pelo que nada tenho a apontar-lhes.Sente que, numa perspetiva de continuidade de trabalho, o clube está mais bem preparado para enfrentar a próxima época?Não, o Vaerlose BBK não vai continuar na Liga Feminina, tendo decidido terminar o projeto sénior. Na linha da seriedade de que falava, a cultura nórdica não é compatível com “meios projetos” ou “esperanças”. Ou têm as condições à partida ou pura e simplesmente não avançam. O Clube não tinha atletas seniores suficientes para compor um plantel e as sub-18 não eram suficientemente competitivas para realizarem, na sua totalidade, uma época na liga feminina. Assim, propuseram-me outro projeto no clube, que declinei, pois entendo que devo continuar no setor feminino e com uma equipa sénior.O campeonato dinamarquês é suficientemente competitivo e desafiante de forma a poder-se sentir realizado do ponto de vista profissional?Esta pergunta não tem uma resposta fácil pois é muito subjetiva. A Liga Dinamarquesa, sendo muito competitiva é ainda assim inferior à Portuguesa, não tanto pela qualidade das jogadoras dinamarquesas, mas pelo menor numero de praticantes e sobretudo pelo não investimento em jogadoras estrangeiras do mesmo nível das que jogam em Portugal. Isso somado confere a tal qualidade inferior, mas desenganem-se aqueles que por isso consideram o campeonato menos competitivo ou desafiante. Por outro lado, as diferenças de cultura social e desportiva, tornam o trabalho do treinador estrangeiro muito mais difícil mas muito mais desafiante. A tarefa de tentar obter o melhor dos “dois mundos” é complicada mas ao mesmo tempo aliciante. Na minha opinião, só se afirma e granjeia respeito além fronteiras, aquele treinador que consegue “revoluções” tranquilas, aquele treinador que é capaz de importar a sua filosofia para a sua equipa, sem descaracterizar as jogadoras. Por esse facto, estou muito realizado pela experiência que estou a viver fora de portas e considero-me hoje, um treinador mais completo e “mais adulto” do que saí.Quais as principais diferenças que apontaria entre uma jogadora portuguesa e uma dinamarquesa?A diferença é grande e está enraizada na cultura nórdica, como é óbvio. O cidadão nórdico, grosso modo, pratica hobbies na condição “sine qua non” de que isso o faça feliz. Se porventura isso não acontece, pura e simplesmente não o faz. Ora o basquetebol, para 90% das praticantes, é um hobby e a necessidade de essa atividade ser um motivo de felicidade para a atleta, está sempre presente. Por aqui já podes ver o quão difícil é encontrar o ponto de equilíbrio entre o fator lúdico e o fator competitivo. A dimensão social e cívica que o basquetebol tem para o praticante, por vezes, é esmagadora e torna o trabalho de um treinador latino complicado. O “team building” e o “mental coaching” são a ementa do dia-a-dia. Diria que em Portugal se dá uma menor importância a esses aspectos e o nível de sacrifício empregue pelas atletas portuguesas é normalmente superior. Existem outras pequenas diferenças mas esta é de facto, a mais importante.O futuro passa por continuar pela Dinamarca? E em caso afirmativo, se já pensou o que pretende fazer na próxima temporada?Sim, irei permanecer na Dinamarca. Em função do que acima explanei, aceitei o desafio proposto pelo BMS – Falcon e irei mudar de Clube, continuando a treinar uma equipa sénior feminina na Liga. É um desafio muito interessante, que resulta de uma joint venture entre dois clubes, com muita gente e gente muito jovem. Pelo que pude já verificar, existe talento nessa lote de jogadoras, muitas delas a competir igualmente nas Seleções jovens dinamarquesas. Por ora ainda não traçamos objetivos competitivos para a próxima época, o que só irá acontecer depois de iniciar a época e sentir o “pulso” à equipa e ao Clube. Mas motivação não me falta e estou ávido de continuar o meu projeto como treinador além fronteiras.